Conhecido como torturador do regime militar, Joo Lucena Leal conta detalhes da represso, mas nega tortura 502x5q "Jos Genuno entregou meio mundo. A comisso da verdade uma balela. Chico Mendes era um escroque. No tem preo para eu advogar para o Walter Arajo. um escroque".  Citado no livro ‘Brasil – Tortura Nunca Mais’, ex-delegado d o troco: “tomada de poder em 1964 foi apoiada pela igreja e financiada pelos EUA” (Entrevista concedida a Carlos Arajo) Por Carlos Arajo Prximo de completar 40 anos (agora em maro), o contragolpe de 1964, que derrubou o presidente Joo Goulart, ainda hoje d o que falar, principalmente pelos inmeros casos de torturas e de mortes e desaparecimentos registrados no perodo que perdurou de 1964 a 1985, com a posse do primeiro presidente civil em duas dcadas. Apesar de ter ficado conhecido como um golpe de estado orquestrado pelos militares, muitas so as verses sobre o que aconteceu realmente naquele perodo. Para falar um pouco sobre o assunto, a Entrevista da Semana do www.ouropretoonline.atualizarondonia.com.br conversou com o advogado Joo Lucena Leal, um dos personagens que atuou diretamente na represso, nos anos em que os militares estavam no poder e teve um de seus codinomes citado no livro ‘Brasil Tortura Nunca Mais’, prefaciado pelo ento cardeal arcebispo de So Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns. Aos 74 anos, sade debilitada e andando com apoio de uma muleta e ajuda de pessoas, Joo Lucena acredita que viver por, no mximo, mais cinco anos. Como delegado da Polcia Federal que atuou na represso resistncia, Lucena foi acusado de ter torturado at a morte uma mulher grvida, em Belm, no estado do Par. Ele nega, mas ite que teve participao direta em vrias operaes militares e sustenta a tese de que no houve golpe de estado, mas uma tomada de poder apoiada pela igreja catlica e financiada pelo governo dos Estados Unidos. Na entrevista ao jornalista Carlos Arajo, o advogado revela que o contragolpe teve incio em 1 de abril, mas historicamente foi datado em 31 de maro para no coincidir com o Dia da Mentira. A exemplo dos militares brasileiros que so a favor do golpe, Lucena acredita que o que aconteceu no foi uma revoluo, “Foi uma ou contrarrevoluo, para contrapor-se ditadura comunista que se queria implantar no Brasil, com apoio da Unio Sovitica e de Cuba”, afirma Lucena, com ar de convico. Jango havia sido democraticamente eleito vice-presidente pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – na mesma eleio que conduziu Jnio da Silva Quadros, do Partido Trabalhista Nacional (PTN) Presidncia da Repblica, apoiado pela Unio Democrtica Nacional (UDN). O golpe estabeleceu um regime alinhado politicamente aos Estados Unidos e acarretou profundas modificaes na organizao poltica do pas, assim como na vida econmica e social. Todos os cinco presidentes militares que se sucederam desde ento se declararam herdeiros e continuadores da Revoluo de 1964. O regime militar durou at 1985, quando Tancredo Neves foi eleito indiretamente pelo Colgio Eleitoral o primeiro presidente civil desde 1964. Alm de figurar como um dos supostos torturadores da poca da ditadura militar, Joo Lucena aparece no cenrio internacional como o advogado que defendeu nada mais nada menos que Darli Alves, o homem que assassinou o seringueiro e ativista ambiental Chico Mendes. Aos 74 anos, detestado pela esquerda e desprezado pela direita, Joo Lucena conta a verso de quem participou do golpe de estado que marcou a histria recente do pas e do estado de Rondnia. Confira a seguir a entrevista: Tudorondonia – Como o senhor Ingressou na Polcia Federal? Joo Lucena – Eu era da estrutura anterior, DRPB, Departamento Regional de Polcia de Braslia, no incio da cidade de Braslia. Com a posse do presidente Jnio Quadros, em 1961, foi transferido o DFSP (Departamento Federal de Segurana Pblica) para Braslia. Em 1964 foi editada a lei 4.483/64, que criou o Departamento de Polcia Federal, DPF, com estrutura Nacional. Nos estados foi criado o Servio Federal para combater o contrabando e a sonegao de imposto, ainda no governo Jnio Quadros. Tudorondonia – O senhor ingressou como agente, como escrivo? Joo Lucena – Com a criao Departamento de Polcia Federal, foi aproveitada a estrutura anterior e eu era dessa estrutura. Quando houve a revoluo, em 1964. Revoluo, no, tomada de poder porque no houve revoluo no Brasil. Tudorondonia – Pelos militares? Joo Lucena – No foi militar, no. Vocs esto muito enganados. Quem tomou o poder foi o governador de Minas Gerais, Magalhes Pinto, e o governador da Bahia, Juraci Magalhes. Tudorondonia – Mas tudo com apoio dos militares? Joo Lucena – Nada. Foi a igreja. Vocs no sabem da histria. A igreja comeou a andar nas avenidas com o tero na mo e teve a TFP, Tradio Famlia e Propriedade. Quem tomou o poder foi a igreja catlica. Tudorondonia – Essa uma informao interessante Joo Lucena – ... Tudorondonia – Quando iniciou seu trabalho como agente efetivo de combate e represso aos agentes de esquerda? Joo Lucena – Quando os militares assumiram, e a igreja disse que a corrupo estava desenfreada e que os militares no podiam deixar o comunismo tomar conta do Brasil, com apoio dos cabeas da igreja catlica, D. Helder Cmara, D. Paulo Evaristo Arns, Alosio Losheider. Tudorondonia – E quando iniciou seu trabalho? Joo Lucena – Em 1967 eu estava lotado no Cear, na Delegacia Regional do DFSP. Na poca no havia ainda o conceito de terrorismo pela tomada de poder. Nos movimentos de rua tomaram parte Tarcisio Leito, Jos Genoino, Joo de Paulo, Moema Correa Santiago, que era filha do dono do Cartrio Moraes Correa, em Fortaleza. Foi a que a igreja catlica alertou os militares para agir e no deixar o comunismo tomar conta. Mas os padres progressistas comearam a rebelar-se contra os bispos e arcebispos catlicos mais antigos. Havia um bispo no Crato (CE) que recebia dinheiro dos EUA, no programa Aliana Para o Progresso, implantado pelo presidente John Kennedy. Essa aliana mandava trigo para os pobres e dizem, vinha armamento nos fardos de farinha de trigo. Alm disso, o bispo no distribua o trigo para os pobres. Ele vendia. Comearam a surgir denncias contra ele e de roubo dentro da igreja. Foi ai que os militares comearam a investigar e a combater os padres e bispos de esquerda, que se diziam progressistas. Pegaram D. Helder Cmara no Recife e o taxaram de comunista. Tudorondonia – Vamos prosseguir? Joo Lucena – Foi a que Dom Helder Cmara comeou a viajar pelo Nordeste. Ele foi ao Crato, Iguatu, Petrolina e comeou a reunir em torno de si a intelectualidade, que na poca era rasteira, no era como hoje. Ento a oficialidade – capites e tenentes – comeou a fomentar nos quartis a luta contra o comunismo. No jornal Folha de So Paulo, em uma entrevista que eu dei h um ms, eu disse: vocs diziam que havia comunismo, mas no era. Veja o exemplo de Leonel Brizola, ele no pregava o comunismo. Ele pregava a socializao do povo. Ele era deputado federal pelo Rio de Janeiro e viajava pelo Brasil pregando a socializao do povo. Ento os militares comearam a persegui-lo. Tudorondonia – A revoluo estourou em 31 de maro de 1964? Joo Lucena – Que nada. A revoluo ou tomada de poder, ocorreu em 1 de abril. Os militares adotaram o 31 de maro para fugir da data do 1 de abril, que o Dia da Mentira. Tudorondonia – Como isso ocorreu? Joo Lucena – Fizeram um assalto em Maranguape (CE), chefiado por Joo de Albuquerque Montes Neto. Tudorondonia – O Comandante Marcos participou desse assalto? Joo Lucena – No. O comandante Marcos (Jos Sales de Oliveira) era especializado em assaltar agiotas. Ele matou o empresrio Jos Armando Fernandes Ximenes, em um assalto na serra da Ibiapaba. Ele foi o nico condenado a pena de morte. Depois foi indultado para priso perptua. Depois foi anistiado pelos militares. Tudorondonia – O senhor ficou conhecido nacionalmente por ter atuado na represso, nos anos em que os militares estavam no poder. Inclusive o seu nome figura no livro Brasil Tortura Nunca Mais, prefaciado por Dom Paulo Evaristo Arns. Mas eu no vi o seu nome no livro. Joo Lucena – Est o meu codinome. Tudorondonia – Como o senhor se sente? uma fama para o senhor? O Senhor tem orgulho disso? Joo Lucena – Eu prestei servio ptria. Isso no motivo de orgulho. Quem prestou servio naquele tempo hoje vive assombrado. o caso do major Sebastio Curi. Mas eu no ando com um canivete. Quem vai querer me matar....? Porque os terroristas daquele tempo, assaltantes de banco, hoje esto assaltando dinheiro pblico. Veja o caso do Sebrae, esto assaltando dinheiro pblico. Tudorondonia – Como o senhor recebe essa acusao da esquerda de que um torturador? Joo Lucena – Eu acho bom. Eu nunca torturei ningum. No aparece nenhum vagabundo que diga que foi torturado por mim. Nem como delegado de polcia aqui em Rondnia. Eu prendi, mas no torturei. E eu comandei aqui a Operao Caa Pistoleiro, em 1981. Tudorondonia – E verdade que o senhor torturou at a morte uma moa grvida, em Belm? Joo Lucena – Quando eu trabalhei em Belm, era 1962, 1963 e 1964. No tinha havido ainda a tomada de poder. Tudorondonia – Como foi sua relao com o Comandante Marcos, o Jos Sales de Oliveira, o ltimo preso poltico a ser libertado no Brasil, que morreu aqui em Rondnia? Joo Lucena – Eu me encontrei com ele aqui em Rondnia, inclusive, eu fui candidato a deputado federal, em 1986, e ele foi candidato a deputado estadual na minha chapa. Tudorondonia – Quando o senhor o prendeu, l no Cear? Joo Lucena – No dia 30 de dezembro de 1971. Tudorondonia – A partir dessa priso ele foi encarcerado, ou foi logo libertado? Joo Lucena – No. Ele ficou encarcerado. S foi solto para vir para Rondnia. Tudorondonia – Ele lhe procurou logo, como foi? Joo Lucena – Eu o encontrei no gabinete do governador, coronel Jorge Teixeira. Tudorondonia – Qual foi a reao dele? Ele ficou assustado quando lhe viu? Joo Lucena – No. Ele era muito frio. Tudorondonia – O senhor participou da captura do capito Lamarca? Joo Lucena – Participei da operao. Quem prendeu o Lamarca foi o coronel Newton Cerqueira. Tudorondonia – Nessas diligncias em que o senhor tomou parte como agente federal e delegado de polcia civil, o senhor matou algum? Joo Lucena – Nunca matei ningum. Tenho minha alma entregue a Deus. Tudorondonia – O senhor sente algum remorso? Joo Lucena – No tenho remorso de nada. Foi um servio prestado ptria. Tudorondonia – O senhor chefiou a operao Caa Pistoleiro e a operao Garimpo, nos anos 80, aqui em Rondnia. A operao Caa Pistoleiro foi uma imposio do governo federal para criar o estado de Rondnia. O senhor pode falar um pouco sobre essas operaes? Primeiro sobre a operao caa pistoleiro, como se deu essa operao? Joo Lucena – Essa operao era para prender os marginais de outros estados que vinham para Rondnia. Tudorondonia – Tinha realmente muito pistoleiro? Joo Lucena – S de uma cacetada, eu prendi setenta pistoleiros. Tudorondonia – Como delegado, o senhor desvendou o crime que resultou na morte do advogado Agenor de Carvalho? Como o senhor conseguiu desvendar e quais as conseqncias desse crime? Joo Lucena – Esse crime ensejou a operao caa pistoleiro. Mataram o doutor Agenor de Carvalho na Rua Julio de Castilhos, 540, esquina com a Rua Duque de Caxias, perto da 17. Brigada. Eu comecei a investigar os grandes daqui, eram seringalistas como Jos Milton Rios, Walmar Meira, que era fazendeiro na rea de Ji-Paran, e os donos da Colonizadora Calama, que tinha como advogado o doutor Jos de Abreu Bianco. Tudorondonia – O Walmar era dono da Calama Colonizadora? Joo Lucena – No. Ele era dono de um seringal, de 280 mil hectares, onde hoje o municpio de Urup. Fui eu que mandei cortar em lotes e distribuir a posseiros. Fiz isso tambm em Nova Londrina, que atualmente distrito de Ji-Paran. Depois o governo fez a regularizao fundiria Tudorondonia – Como o senhor conheceu o coronel Jorge Teixeira de Oliveira, primeiro governador do estado? Joo Lucena – Eu participei com ele da Operao Xambio (Guerrilha do Araguaia). Tudorondonia – Quem hoje est no poder que participou a Operao Xambio? Joo Lucena – Jos Genoino (ex-deputado federal atualmente condenado pelo Supremo Tribunal Federal a seis anos de cadeia pelo seu envolvimento no mensalo, cumprindo a pena em priso domiciliar). Tudorondonia – O senhor prendeu Jos Genono em Xambio? Ele realmente entregou os companheiros? Joo Lucena – Ele entregou meio mundo. Entregou o Oswaldo, que era o comandante da operao. O Oswaldo era um ex-tenente R/2 do Exrcito, que fugiu com armamento, do mesmo jeito que fez o Lamarca. Tudorondonia – O senhor poderia falar sobre a chacina do Palmeiral, aqui no rio Madeira, na poca do Garimpo? Joo Lucena – No era do meu tempo. Eu j era advogado. No estava mais militando como delegado. Tudorondonia – O senhor teve envolvimento na morte do Assis, aquele comprador de ouro, em 1982? Joo Lucena – No. Eu estava em campanha para deputado federal. Tudorondonia – Por que o senhor saiu da polcia? Joo Lucena – Eu me afastei para fazer minha campanha para deputado federal. Tudorondonia – Dizem que, naquela eleio, o senhor dormiu eleito e acordou derrotado. verdade? Joo Lucena – Eu dei entrevista como deputado federal e acordei primeiro suplente. Tudorondonia – O senhor acha que houve manobra? Joo Lucena – Sim. Dois juzes, em Ji-Paran, elegeram o Assis Canuto, a pedido da Eucatur. Tudorondonia – Como foi sua agem na poltica de Rondnia? Chegou a assumir mandato de deputado federal? Joo Lucena – Assumi em 1985, no lugar do Chiquilito Erse, quando ele disputou a prefeitura de Porto Velho. Tudorondonia – O senhor disputou outras eleies? Joo Lucena – Em 1986 fui candidato a deputado federal constituinte. Em 1990 fui candidato a deputado estadual. Tudorondonia – O senhor serviu ao governador Jorge Teixeira na rea de segurana pblica. Como era o combate ao crime, naquela poca, e como hoje, na sua viso de advogado? O senhor acha que a polcia trabalha com o mesmo afinco ou faz corpo mole? Joo Lucena – A polcia hoje est tolhida de exercer sua atividade como manda a lei porque existe a deputncia, cheia de deputados safados. O legislativo daqui cheio de deputado safado, pouqussimos escapam. O Poder Judicirio tem de cumprir o que a lei determina. Tudorondonia – O senhor acha que o Ministrio Pblico ajuda a tolher o trabalho da polcia? Joo Lucena – No. O MP contribui para a aplicao da lei. Tudorondonia – Dizem que de cada cem inquritos, apenas quatro chegam a fase de denncia e desses, apenas dois vo a julgamento. O senhor acredita que isso contribui para esse clima de insegurana? Joo Lucena – Sim. Tudorondonia – O Brasil inteiro lhe conhece. O senhor foi convocado pela comisso da verdade, que o Governo da presidente Dilma (PT) instalou? Joo Lucena – Me convocaram, mas eu no fui. Tudorondonia – Por que o senhor no foi? Joo Lucena – A Comisso da Verdade uma balela.
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