O megadecreto anunciado na quarta-feira (20) pelo presidente da Argentina, Javier Milei, traz mudanas de impacto para a economia do pas. Entre elas, a medida abre caminho para a privatizao de empresas pblicas, flexibiliza o mercado de trabalho e cria uma poltica de cus abertos na aviao.
O texto, publicado por meio de um Decreto de Necessidade e Urgncia (DNU), entrou em vigor nesta quinta-feira (21).
Para economistas ouvidos pelo g1 e pela GloboNews, a medida traz mudanas profundas no mercado de trabalho argentino e nos preos — e deve impulsionar a inflao em um primeiro momento. A avaliao, no entanto, de um horizonte positivo, com maior segurana institucional e econmica no mdio e no longo prazo. (leia mais abaixo)
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Na prtica, o decreto modifica ou revoga mais de 350 normas e viabiliza a desregulamentao econmica do pas — de modo que o Estado interfira o mnimo possvel na economia. A medida uma das promessas de campanha de Milei, um economista ultraliberal.
O anncio da quarta-feira faz parte de um pacote de mudanas que o novo governo vem implementando na Argentina. As medidas tm sido recebidas com protestos nas ruas de Buenos Aires, em atos marcados por confrontos entre manifestantes e policiais.
“Estamos fazendo o mximo para tentar diminuir a crise que herdamos", disse o presidente ao anunciar o pacote, chamado na imprensa argentina de "decretazo" ("decreto", em traduo livre).
O texto entra em vigor imediatamente. Nos prximos dias, ser analisado por uma comisso formada na Cmara e no Senado, para ento ser votado no Congresso.
Vale ressaltar que o Decreto de Necessidade de Urgncia est previsto na Constituio Nacional argentina, mas o uso por Milei ainda pode ser questionado na Justia.
Para advogados constitucionalistas ouvidos pelo jornal argentino La Nacin, nesse caso, o DNU no atende aos requisitos de urgncia necessrios para sua aplicao.
Os especialistas afirmam que Milei teria ultraado seus poderes, avanando sobre as competncias do Congresso. Destacam ainda o fato de o decreto no ter ado pelo filtro da jurisprudncia do Supremo do pas.
Entenda abaixo os principais pontos do decreto e seus impactos na economia argentina.
REFORMA TRABALISTA
Na anlise do economista Bruno Musa, scio da AcquaVero Investimentos, o decreto mira principalmente a flexibilizao dos preos, permitindo que sejam determinados pela livre oferta e demanda. O objetivo seria incentivar a produo e, assim, evitar a escassez.
Um item de destaque do decreto prev a "modernizao do regime de trabalho para facilitar os processos de gerao de emprego genuno". A expectativa que, na prtica, essas alteraes signifiquem uma profunda reforma trabalhista no pas.
Pelo texto, o objetivo do governo "reforar o princpio da liberdade contratual entre as partes", o que inclui a garantia de que "as obrigaes contratuais em moeda estrangeira sejam pagas na moeda acordada".
O economista Bruno Musa acredita que as medidas vo, de fato, promover flexibilizao dos contratos e, consequentemente, do mercado de trabalho.
O especialista tambm destaca um trecho do decreto que determina que os acordos trabalhistas tero de ser, obrigatoriamente, firmados entre as partes, sem interveno do Estado.
"Mais fcil de contratar, mais fcil de demitir. Isso significa uma economia mais pujante, sem qualquer interveno estatal em determinar o preo dos servios", afirma.
Nesse contexto, o jornal argentino Infobae destacou que a reforma trabalhista deve iniciar uma "relao tempestuosa entre o novo governo e o sindicalismo".
Nessa mesma frente, o novo decreto de Milei determina que, em caso de greves de setores e servios considerados essenciais, pelo menos 75% dessas atividades permaneam em funcionamento. A regra vale para hospitais, servios de transporte de gua, combustveis, educao infantil, entre outros.
O trecho tambm estabelece funcionamento de, no mnimo, 50% para atividades de "importncia transcendental" — caso dos correios, da comercializao de alimentos e servios bancrios e financeiros.
Outro ponto de conflito est na mudana na regra de pagamentos das "cotas solidrias" aos sindicatos, que eram obrigatrios para afiliados e no afiliados. Agora, qualquer pagamento s ser realizado com consentimento e autorizao explcita do trabalhador.

LIBERALIZAO DO COMRCIO
Assim como no mercado de trabalho, Milei tambm fez importantes modificaes nas regras sobre o comrcio na Argentina.
Uma delas a revogao da Lei das Gndolas, que estabelecia que as prateleiras de supermercados deveriam oferecer produtos de empresas pequenas e regionais. A norma tambm limitava a quantidade de itens de uma mesma marca.
O novo decreto revogou ainda a Lei do Abastecimento, que permitia que o governo limitasse os aumentos de preos.
De acordo com Musa, da AcquaVero, essas medidas promovem a liberdade econmica de preos e devem ajudar o pas a enfrentar a inflao no mdio e no longo prazo. Atualmente, o ndice de preos do pas j a de 160% no ano.
Na avaliao do economista, o controle de preos — que at ento era praticado pelo governo — tende a gerar uma sensao de benefcio no curto prazo. Ele aponta, no entanto, que o efeito prtico nesse caso tende a ser o contrrio: aumento da presso inflacionria.
"Os preos so determinados pela lei da oferta e demanda. Se voc tabela um preo, isso leva falta de produo. Ou seja, os empreendedores deixam de produzir esses produtos que no compensam mais no preo acordado, uma vez que [a regulamentao dos preos] uma medida para segurar artificialmente a inflao", pontua.
No mesmo sentido, o governo revogou a Lei do Aluguel, que estabelecia contratos de trs anos e proibia acordos em dlares. Com a mudana, os aluguis tero durao de dois anos, com atualizaes semestrais, e os contratos tambm podero ser firmados em dlares.
O economista Roberto Luis Troster disse, em entrevista GloboNews, que essas medidas devem causar uma rpida disparada da inflao no curto prazo, justamente pelo fim do controle dos preos.
Isso deve ter um peso importante no bolso dos consumidores argentinos — principalmente em um momento em que a pobreza atinge cerca de 40% da populao.
Por outro lado, como a economia argentina j muito ligada ao dlar (a populao prioriza manter suas reservas na moeda norte-americana por conta da desvalorizao do peso argentino), Troster considera que o processo de desinflao (queda nos preos) tambm no deve demorar a comear.
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PRIVATIZAES
Alm da reforma trabalhista e do fim do controle de preos, o decreto de Milei tambm abarca uma de suas principais promessas para a economia: a privatizao das empresas estatais.
So trs as principais mudanas que abrem esses espaos:
Revogao da regulamentao que impede a privatizao de empresas pblicas;
Revogao do regime das empresas estatais;
Transformao de todas as empresas do Estado em sociedades annimas para sua subsequente privatizao.
Para o economista Bruno Musa, as mudanas no mercado de trabalho e o fim da regulao dos preos deve garantir maior segurana jurdica, institucional e econmica Argentina. " o que atrai investimentos no mdio e longo prazo", diz.
Neste contexto, o prximo o seria iniciar as privatizaes, apontam especialistas.
Em um primeiro momento, o processo de venda de estatais iniciativa privada pode gerar uma forte onda de demisses no pas, assim como ocorreu no perodo do Plano Cavallo. Hoje, a taxa de desemprego na Argentina gira em torno de 7% da populao.
Porm, para o longo prazo, as perspectivas so otimistas, uma vez que a expectativa que as mudanas atraiam mais investimentos estrangeiros para o pas.
Sobre a possibilidade de as medidas apresentarem os efeitos desejveis, o economista Bruno Musa acredita que Milei ter seus primeiros resultados em at dois anos — apesar das dificuldades que o novo presidente deve enfrentar no Congresso.

Foto: Reproduo
Veja a lista dos 30 principais decretos de Javier Milei:
Revogao da Lei do Aluguel;
Revogao da Lei de Abastecimento;
Revogao da Lei das Gndolas;
Revogao da Lei Nacional de Compras;
Revogao do Observatrio de Preos do Ministrio da Economia;
Revogao da Lei de Promoo Industrial;
Revogao da Lei de Promoo Comercial;
Revogao da regulamentao que impede a privatizao de empresas pblicas.
Revogao do regime das empresas estatais;
Transformao de todas as empresas do Estado em sociedades annimas para sua subsequente privatizao;
Modernizao do regime de trabalho para facilitar o processo de gerao de emprego;
Reforma do Cdigo Aduaneiro para facilitar o comrcio internacional;
Revogao da Lei de Terras;
Modificao da Lei de Combate ao Fogo;
Revogao das obrigaes das usinas de acar quanto produo;
Liberao do regime jurdico aplicvel ao setor vitivincola;
Revogao do sistema nacional de comrcio mineiro e do Banco de Informao Mineiro;
Autorizao para transferncia do pacote total ou parcial de aes das companhias areas argentinas;
Implementao da poltica de cu aberto;
Modificao do Cdigo Civil e Comercial para reforar o princpio da liberdade contratual entre as partes;
Modificao do Cdigo Civil e Comercial para garantir que as obrigaes contratuais em moeda estrangeira sejam pagas na moeda acordada;
Modificao do marco regulatrio de medicamentos pr-pagos e obras sociais;
Eliminao de restries de preos na indstria pr-paga;
Incorporao de empresas de medicamentos pr-pagos ao regime de obras sociais;
Estabelecimento das prescries mdicas eletrnicas;
Modificaes ao regime das empresas farmacuticas para promover concorrncia e reduzir custos;
Modificao da Lei das Sociedades por Aes para que os clubes de futebol possam se tornar corporaes;
Desregulamentao dos servios de Internet via satlite;
Desregulamentao do setor de turismo;
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Incorporao de ferramentas digitais para procedimentos de registro automotivo.
Fonte: G1