Urgente : A Justia do Brasil depende do pedigree dos rus Por Leonardo Sakamoto
Enviado por alexandre em 14/04/2018 23:31:43


A Justia no Brasil sempre foi seletiva. Sua velocidade, por exemplo, depende de quem so os rus, seu pedigree e conta bancria. Pode ser mais rpida ou mais lenta de acordo com a necessidade. E mais ou menos condescendente tambm.

Se for pobre e negro, est lascado. Por outro lado, ricos e brancos tm mais chances de ter uma interpretao da lei que os favoream. Seja porque tem mais recursos para gastar em sua defesa, seja porque sua rede de proteo maior e alcana as pessoas certas. Isso sem contar as preferncias poltico-ideolgicas em comum – afinal de contas, o Poder Judicirio no est desconectado do tecido social para ser imune a ele.

Muito pelo contrrio. Se h magistrados comprometidos com os direitos fundamentais, h outros comprometidos com sua prpria classe.

O Superior Tribunal de Justia salvou o pescoo de Geraldo Alckmin das mos da Operao Lava Jato, enviando seu processo para a Justia Eleitoral aps ele ter perdido o foro privilegiado com sua renncia ao governo paulista para disputar a Presidncia da Repblica. Questionado, o vice-procurador-geral da Repblica, Luciano Mariz Maia, afirmou que a delao da Odebrecht s tinha elementos para questionar Alckmin por crime eleitoral (Caixa 2) e no corrupo iva.

Pode ser. Mas por muito menos que isso, cardeais petistas tornam-se rus. Alm disso, o histrico das investigaes recentes no pas mostra que h um tratamento diferenciado para cardeais tucanos em detrimento a membros de outros partidos. Natural, portanto, a estranheza sobre o encaminhamento do caso para a primeira instncia eleitoral, ainda mais de um processo sob o manto do sigilo.

Apesar de corrupo no ser monoplio de determinada agremiao ou governo e ser um problema estrutural, a Justia parece estar se esforado em nos convencer do contrrio. E pelo comportamento virulento de certos internautas, que acham que o pas se tornou a Terra Prometida aps a priso de Lula, com leite e mel correndo pelo meio-fio de grandes avenidas, creio que essa imagem que est colando para uma parte da populao. Daqui a pouco, todos se daro por satisfeitos e os trabalhos da Lava Jato so encerrados.

Mas a Justia tambm pode ser seletiva com ela mesmo. Como o caso de casais de juzes que acumulam auxlio-moradia, como o juiz Marcelo Bretas, responsvel pela Lava Jato no Rio e sua companheira. Vale ressaltar que ele no recebeu isso automaticamente. Teve que correr atrs e lutar pelo que afirma ser um direito seu.

Falando em previso de direitos, o artigo 7, inciso IV, da Constituio Federal prev que o salrio mnimo seja ”capaz de atender s suas necessidades vitais bsicas e s de sua famlia, como moradia, alimentao, educao, sade, lazer, vesturio, higiene, transporte e Previdncia Social”. E seja ”reajustado periodicamente, de modo a preservar o poder aquisitivo, vedada sua vinculao para qualquer fim”. Porm, se um morador de So Jos da Tapera, nos serto de Alagoas, pedir Justia que o seu salrio-mnimo atenda tudo isso a, ser encaminhado para tratamento de demncia.

O curioso que, enquanto a maior parte das postagens nas redes sociais mostrava indignao pelo privilgio dobrado, muitos defendiam a graa alcanada afirmando que os juzes da operao podem ter o que quiserem por ”trazerem moralidade ao pas”.

Cidados que afirmam lutar contra a corrupo deveriam ser os primeiros a ir contra privilgios pagos com recursos pblicos. Mas parte da sociedade no se importa e defende que deva existir uma casta diferenciada. Pessoas que conquistaram o direito de terem privilgios perante a lei.

Isso, quando toca o cho da vida cotidiana, refora aberraes.

Qualquer resqucio de pudor vindo de pessoas que j se sentiam superiores s demais, por sua classe social, cor de pele, etnia desaparece.

O trnsito, espao de contato de diferentes grupos que, caso contrrio, nunca trombariam, confirma essa hiptese.
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Um carro que deve custar o mesmo que o apartamento em que moro parou em frente garagem do prdio para sua dona fazer compras na loja frente. Diante da reclamao, ficou irritada. Afinal, por que no podamos esper-la s por uns minutos. Li quatro histrias semelhantes a essa na ltima semana. Sempre com algum que, em sua cabea, acreditava que o pas existe para servi-lo. E quem no conseguia entender isso e questionava ou era tratado como burro ou como subversivo que precisa ser colocado em seu devido lugar.

Se at a Justia considera que existem algumas pessoas que esto acima do restante de ns, por que quem tem um pouco a mais na conta bancria deve manter as aparncias? Mandando s favas os escrpulos, o sujeito que se sente diferenciado, diante de uma rplica, estufa o peito e, sem medo do ridculo, solta um ”voc sabe com quem est falando?”. Frase que uma herana de um Brasil dividido entre aqueles feitos para servir e os que nascem para serem servidos.

A ”faxina” promovida pelo combate corrupo no atingiu todo o espectro partidrio envolvido em denncias. Diante do fato de que at uma morsa com problemas de viso devido falta de vitaminas consegue perceber isso, quem diz que ”a lei para todos” ou mal informado ou age de m f.

Sabe aquela histria de ”primeiro a gente tira a Dilma, depois tira o resto?” Mentira. E muitos caram nela. Feito patinhos que seguiam um pato amarelo.

Instituies foram esgaradas para que o impeachment coubesse nas necessidades do poder econmico e da velha poltica. E seguem sendo esgaradas quando a dureza da lei aplicada a apenas um lado da histria, enquanto o outro continua fazendo o que quer. Mas agora com a sensao de liberdade plena lambendo suas faces.
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Com o aprofundamento do esgaramento, pagamos todos o preo do clima de desrespeito a leis e regras com o consequente ”foda-se” a tudo aquilo que nos une como um pas.

E como o resto do pas, que no nasceu em bero de ouro, responde a isso? H aqueles cujo desejo serem iguais aos lderes polticos, judiciais e econmicos que idolatram. Esses seguem sendo guerreiros de uma realidade que no sua, torcendo para um dia ”chegarem l”. E, enquanto isso, seguem mostrando todos os dentes a quem questiona seus mestres.

O restante cultiva desalento, impotncia, desgosto e cinismo. Isso no estoura em manifestaes com milhes nas ruas, mas gera uma bomba-relgio que vai explodir invariavelmente em algum momento, ferindo de morte a democracia. Pois cadas em descrena, instituies levam dcadas para se reerguer – quando conseguem. No meio desse vcuo, surge a oportunidade que, dentre os semoventes que se consideram acima das leis, alguns se apresentem como a sada para os nossos problemas. Como salvadores da ptria.

A triste constatao ao fim de tudo isso que a ptria precisa ser salva dos salvadores da ptria.



Fonte: Blog do Sakamoto

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