Uma proposta de nova legislao sobre a demarcao de terras indgenas, pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), abre caminho para que seja autorizada a minerao em terras demarcadas. a3k4j
O texto, que discutido ao longo desta segunda-feira (17), em audincia no Supremo, resulta de longo processo de conciliao iniciado em agosto do ano ado, com a participao de lideranas indgenas, representantes dos Trs Poderes e da Procuradoria-Geral da Repblica (PGR).
Mendes relator de cinco aes sobre a tese do marco temporal, segundo a qual as terras indgenas (TIs) somente poderiam ser demarcadas em reas efetivamente ocupadas no momento da promulgao da Constituio Federal, em 5 de outubro de 1988.
O gabinete de Mendes apresentou, na noite da ltima sexta-feira (14), a minuta de um projeto de lei para substituir a atual Lei 14.701/2023, que legalizou a tese do marco temporal e questionada no Supremo pelas lideranas indgenas.
A proposta acatou sete sugestes feitas durante o processo de conciliao. Pelo texto, o direito dos indgenas sobre suas terras tradicionais “independe da existncia de marco temporal” ou de conflito sobre a posse da terra existente no momento da promulgao da Constituio.
Sobre a explorao econmica das TIs, o projeto dedica trs sees inteiras para regulamentar a lavra de recursos minerais em terras indgenasque, pela proposta, deve ser realizada “no interesse nacional” e por prazo determinado. Seria necessria autorizao pelo Congresso. A comunidade afetada ficaria com 50% do valor da Contribuio Financeira pela Explorao Mineral.
O texto regulamenta ainda o “extrativismo mineral” pelas prprias comunidades tradicionais, que poderia ser autorizado por at cinco anos pelo Congresso Nacional.
Pouco consenso
De acordo com Mendes, trata-se de um texto que pretende ser consenso entre as partes envolvidas, sobretudo entre ruralistas e indgenas. Ele deu prazo at dia 24 de fevereiro, prxima segunda-feira, para encerrar os trabalhos da conciliao, que so coordenados por seu juiz auxiliar Diego Viegas Veras.
Na audincia desta segunda (17), contudo, pouco consenso foi demonstrado entre os presentes. Representantes dos indgenas e de outras entidades, incluindo da PGR, se disseram surpreendidos pela incluso da explorao mineral como uma possiblidade aps a demarcao das terras indgenas.
“Talvez fosse necessria uma apresentao daquilo que foi entendido aqui como consenso”, observou a procuradora Eliana Torelli, representante da PGR. “Essa questo de minerao algo que precisa de debate bastante aprofundado, inclusive em questes tcnicas, que escapam completamente seara jurdica”, disse.
O deputado Pedro Lupion (PP-PR) tambm acusou a minuta de no contemplar uma soluo consensual. O parlamentar reclamou que o texto em nada resolve o ime em torno do marco temporal em si, ao mesmo tempo em que toca em questes adjacentes, que no esto na lei j aprovada pelo Congresso, como a explorao econmica das terras indgenas.
“Nossa preocupao o direito de propriedade, o direito dessa rea, de pessoas que ocupamh mais de 100 anos essas reas, pessoas que contribuem para o pas e que am por um momento de insegurana completa”, afirmou Lupion. “Me causou muita estranheza simplesmente deixaren ant[de agem] a questo do marco temporal”.
Por parte da Unio, os representantes do Ministrio dos Povos Indgenas (MPI) e da Fundao Nacional dos Povos Indgenas (Funai) afirmaram no poder opinar sobre o texto por no terem tido tempo de debat-lo com as prprias lideranas indgenas.
“Temos que lembrar que os povos indgenas de todas as regies do pas podem ser afetados por uma proposta que saia daqui desta reunio”, frisou Matheus Oliveira, representante da Funai. Ele afirmou que o rgo “no pode se posicionar por algo que no pde discutir com os povos indgenas”.
A Advocacia-Geral da Unio (AGU), por sua vez, fez um pedido para que o prazo de discusso da proposta seja ampliado.
Entenda
A tese do marco temporal questionada h dcadas no Supremoque, em setembro de 2023, aps diversas sesses de julgamento, decidiu pela inconstitucionalidade do marco temporal para a demarcao das terras indgenas.
Pouco depois, contudo, o Congresso aprovou uma nova lei para validar a tese do marco temporal. A nova legislao chegou a ser vetada pelo presidente Luiz Incio Lula da Silva, que deu como justificativa a prpria deciso do Supremo, mas os vetos foram derrubados em dezembro.
A nova lei se tornou alvo de diversas contestaes no Supremo, que foi provocado a reabrir os debates mesmo depois de j ter julgado em definitivo a questo, o que gerou um ime com o Legislativo.
Relator do tema, Gilmar Mendes decidiu ento abrir um processo de conciliao, no qual defendeu um“novo olhar”sobre a questo. A principal entidade representativa dos indgenas, aAssociao dos Povos Indgenas Brasileiros (Apib), decidiu se retirar dos debates, alegando no haver garantias de proteo s comunidades tradicionais.
FONTE: EBC – Proposta no STF abre caminho para minerao em terras indgenas | Agncia Brasil