Uma Polcia que o povo abomina (*Archimedes Marques)
Junto a uma sociedade em que se clama por Justia e que se tem a Policia como arbitrria, corrupta, abusiva e violenta, est entre todas as instituies policiais como exemplo maior de dignidade e disciplina, a figura da Corregedoria da Polcia, espcie de Polcia da Polcia a policiar os atos indevidos, apurando e encaminhando para Justia os supostos ilcitos penais praticados pelos seus membros. A Corregedoria de Polcia tambm o Juzo da Polcia, vez que julga istrativamente os desvios de conduta e as transgresses disciplinares dos componentes da sua instituio. A Corregedoria de Polcia tem como misso preservar e promover dentre outros, os princpios da legalidade, impessoalidade e moralidade dos atos de gesto, bem como da probidade e responsabilidade dos policiais da sua instituio. No nosso sistema democrtico de direito, o bom trabalho da Corregedoria uma das garantias dos cidados de que policiais de m conduta sejam investigados, punidos, advertidos, afastados e enfim, demitidos a bem do servio pblico. Em contra ponto a tais atributos, o Jornal da Band mostrou nesta sexta-feira, 18/02/2011, um caso de humilhao, aparente abuso, desrespeito aos direitos individuais e constitucionais, no qual Delegados e seus comandados representando a Corregedoria de Polcia Civil de So Paulo, tiraram fora a roupa de uma colega Escriv depois de algem-la, em busca de provas que supostamente a incriminariam em corrupo ativa. O fato aconteceu no 25 Distrito Policial em Parelheiros, zona sul de So Paulo em 15/06/2009, mas as imagens filmadas foram mantidas em sigilo e somente agora veio a tona para espanto e repudio de grande parte da sociedade brasileira. A reportagem televisiva teve o com exclusividade s imagens gravadas pela prpria Corregedoria da Polcia Civil, que mostram o flagrante dado pelos seus integrantes a um suposto crime de concusso praticado ento por uma Escriv de Polcia. Segundo a denncia, a policial teria recebido R$ 200,00 para ajudar um suspeito a se livrar de um inqurito policial.
A apurao inicial para comprovar a suposta corrupo com a conseqente priso em flagrante delito da Escriv transcorria normalmente e dentro da legalidade at que um Delegado decidiu que a suspeita teria que ser revistada e despida a qualquer custo. Usando dos seus preceitos constitucionais, a Escriv no se recusou a ordem, mas pediu a presena de policiais femininas para a conseqente revista.
Entretanto, com o acirramento dos nimos, a emoo sobrepe a razo e inclusive dado tambm voz de priso por supostos crimes de resistncia e desobedincia revoltada policial, que ento algemada indevidamente no restou outra alternativa a no ser relutar em fora reduzida contra a ilegalidade e da ao despiram brutalmente a sua cala e calcinha, para enfim ser aparentemente encontrado escondido o dinheiro procurado e almejado, objeto material do suposto crime de concusso. Assim, o que era para se tornar uma priso de rotina to comum em atos correcionais nas unidades policiais do pas, transformou-se aos olhos de todos, em flagrante desrespeito aos direitos humanos. A cena daquele corpo vencido seminu, obtida de forma violenta, degradante e cruel, mostrou alm do constrangimento, o ultraje a uma Constituio cidad, uma Constituio que zela acima de tudo pelos direitos do cidado. A cena feriu de morte todos ns cidados brasileiros. Dos fatos geraram istrativamente a excluso da suspeita dos quadros da Policia civil paulistana e criminalmente um processo ainda est em andamento na Justia desse Estado por crime de concusso contra a mesma, enquanto que, para os aparentes e possveis atos abusivos e lesivos praticados pelos policiais da Corregedoria, restou o procedimento arquivado com aval do Ministrio Pblico e do Judicirio. comum a imprensa brasileira divulgar imagens de abusos policiais, torturas em presos, maus tratos contra populares e outras tantas cenas no convencionais, contudo, a comprovao de atos abusivos e lesivos praticados por policiais de alguma Corregedoria de Polcia, o rgo policial exemplo, ainda no havia chegado ao conhecimento pblico. ensinamento precpuo que os Juzes e Corregedores em geral devem agir sempre com moderao e circunspeco refletindo e trabalhando com equilbrio, razoabilidade e proporcionalidade para que os seus atos sejam considerados justos. A Polcia representa o aparelho repressivo do Estado que tem sua atuao pautada no uso da violncia legitima, contudo, quando se fala em violncia legtima, se fala em ordem sob a Lei e no sobre a Lei. O chamado Poder de Polcia que possui a fora pblica limitado pela prpria Lei e no pode ser ultraado sob pena de se praticar o abuso previsto com a conseqente quebra dos direitos constitucionais inerentes do cidado. Bem nos ensina a Professora, Jurista e Escritora CRISTINA BUARQUE DE HOLLANDA, ao discorrer na sua obra O problema do controle da Polcia em contextos de violncia extrema: Quando as agencias encarregadas de manter a lei e a ordem descambam para a arbitrariedade e para o comportamento desregrado, instalam inconscientemente o risco de instabilidade do Estado, periclitando suas instituies. Por certo que se alguma margem de desvio do universo formal no compromete a normalidade da rotina de funcionamento do Estado, os contextos de grave disparidade entre desempenho ideal e real das polcias podem alcanar efeitos devastadores de controle na dinmica de legitimao da ordem pblica. Em verdade a filmagem mostra, alm do brutal e inconcebvel ato contrrio ao nosso regime democrtico de direito, um excesso desnecessrio dos Delegados e seus comandados correcionais. Comprovaram que todos so despreparados e atrabilirios. No restaram equilbrio e razoabilidade na presente ao policial. Afinal a Escriv s no queria ar pelo constrangimento de ficar nua na frente de homens, um justo direito. Tudo poderia ser resolvido sem maiores prejuzos com a chamada ao feito de uma Delegada e suas agentes policiais para fazer a revista designada e necessria ali mesmo naquela delegacia, ou ento conduzirem a Escriv suspeita at a Corregedoria de Polcia para as medidas legais e pertinentes, o que em absoluto em nada prejudicaria o flagrante. Medidas devem ser adotadas, istrativamente e judicialmente para que a ordem seja resgatada na Policia civil de So Paulo, sob pena de serem abertos precedentes idnticos nas demais Corregedorias de Policia do Brasil. (*Delegado de Polcia. Ps-Graduado em Gesto Estratgica de Segurana Pblica pela UFS. Exerceu o cargo de Corregedor-Geral de Polcia civil de Sergipe em duas ocasies) [email protected]
Referncias bibliografias: FEITOSA, Denilson. Direito Processual Penal. Teoria, Crtica e Prxis. Niteri: RJ, 2008. BAYLEY, David. Padres de Policiamento. So Paulo: Edusp 2001. TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. So Paulo: Malheiros editores, 2000. COMPARATO, Fabio. A afirmao histrica dos Direitos Humanos. So Paulo: Saraiva, 2007. HOLLANDA, Cristina Buarque de. O problema do controle da polcia em contextos de violncia extrema: Os casos do Brasil, frica do Sul e Irlanda do Norte. Rio de Janeiro: SESC, 2007
Uma Polcia que o povo abomina (*Archimedes Marques)
Junto a uma sociedade em que se clama por Justia e que se tem a Policia como arbitrria, corrupta, abusiva e violenta, est entre todas as instituies policiais como exemplo maior de dignidade e disciplina, a figura da Corregedoria da Polcia, espcie de Polcia da Polcia a policiar os atos indevidos, apurando e encaminhando para Justia os supostos ilcitos penais praticados pelos seus membros. A Corregedoria de Polcia tambm o Juzo da Polcia, vez que julga istrativamente os desvios de conduta e as transgresses disciplinares dos componentes da sua instituio. A Corregedoria de Polcia tem como misso preservar e promover dentre outros, os princpios da legalidade, impessoalidade e moralidade dos atos de gesto, bem como da probidade e responsabilidade dos policiais da sua instituio. No nosso sistema democrtico de direito, o bom trabalho da Corregedoria uma das garantias dos cidados de que policiais de m conduta sejam investigados, punidos, advertidos, afastados e enfim, demitidos a bem do servio pblico. Em contra ponto a tais atributos, o Jornal da Band mostrou nesta sexta-feira, 18/02/2011, um caso de humilhao, aparente abuso, desrespeito aos direitos individuais e constitucionais, no qual Delegados e seus comandados representando a Corregedoria de Polcia Civil de So Paulo, tiraram fora a roupa de uma colega Escriv depois de algem-la, em busca de provas que supostamente a incriminariam em corrupo ativa. O fato aconteceu no 25 Distrito Policial em Parelheiros, zona sul de So Paulo em 15/06/2009, mas as imagens filmadas foram mantidas em sigilo e somente agora veio a tona para espanto e repudio de grande parte da sociedade brasileira. A reportagem televisiva teve o com exclusividade s imagens gravadas pela prpria Corregedoria da Polcia Civil, que mostram o flagrante dado pelos seus integrantes a um suposto crime de concusso praticado ento por uma Escriv de Polcia. Segundo a denncia, a policial teria recebido R$ 200,00 para ajudar um suspeito a se livrar de um inqurito policial.
A apurao inicial para comprovar a suposta corrupo com a conseqente priso em flagrante delito da Escriv transcorria normalmente e dentro da legalidade at que um Delegado decidiu que a suspeita teria que ser revistada e despida a qualquer custo. Usando dos seus preceitos constitucionais, a Escriv no se recusou a ordem, mas pediu a presena de policiais femininas para a conseqente revista.
Entretanto, com o acirramento dos nimos, a emoo sobrepe a razo e inclusive dado tambm voz de priso por supostos crimes de resistncia e desobedincia revoltada policial, que ento algemada indevidamente no restou outra alternativa a no ser relutar em fora reduzida contra a ilegalidade e da ao despiram brutalmente a sua cala e calcinha, para enfim ser aparentemente encontrado escondido o dinheiro procurado e almejado, objeto material do suposto crime de concusso. Assim, o que era para se tornar uma priso de rotina to comum em atos correcionais nas unidades policiais do pas, transformou-se aos olhos de todos, em flagrante desrespeito aos direitos humanos. A cena daquele corpo vencido seminu, obtida de forma violenta, degradante e cruel, mostrou alm do constrangimento, o ultraje a uma Constituio cidad, uma Constituio que zela acima de tudo pelos direitos do cidado. A cena feriu de morte todos ns cidados brasileiros. Dos fatos geraram istrativamente a excluso da suspeita dos quadros da Policia civil paulistana e criminalmente um processo ainda est em andamento na Justia desse Estado por crime de concusso contra a mesma, enquanto que, para os aparentes e possveis atos abusivos e lesivos praticados pelos policiais da Corregedoria, restou o procedimento arquivado com aval do Ministrio Pblico e do Judicirio. comum a imprensa brasileira divulgar imagens de abusos policiais, torturas em presos, maus tratos contra populares e outras tantas cenas no convencionais, contudo, a comprovao de atos abusivos e lesivos praticados por policiais de alguma Corregedoria de Polcia, o rgo policial exemplo, ainda no havia chegado ao conhecimento pblico. ensinamento precpuo que os Juzes e Corregedores em geral devem agir sempre com moderao e circunspeco refletindo e trabalhando com equilbrio, razoabilidade e proporcionalidade para que os seus atos sejam considerados justos. A Polcia representa o aparelho repressivo do Estado que tem sua atuao pautada no uso da violncia legitima, contudo, quando se fala em violncia legtima, se fala em ordem sob a Lei e no sobre a Lei. O chamado Poder de Polcia que possui a fora pblica limitado pela prpria Lei e no pode ser ultraado sob pena de se praticar o abuso previsto com a conseqente quebra dos direitos constitucionais inerentes do cidado. Bem nos ensina a Professora, Jurista e Escritora CRISTINA BUARQUE DE HOLLANDA, ao discorrer na sua obra O problema do controle da Polcia em contextos de violncia extrema: Quando as agencias encarregadas de manter a lei e a ordem descambam para a arbitrariedade e para o comportamento desregrado, instalam inconscientemente o risco de instabilidade do Estado, periclitando suas instituies. Por certo que se alguma margem de desvio do universo formal no compromete a normalidade da rotina de funcionamento do Estado, os contextos de grave disparidade entre desempenho ideal e real das polcias podem alcanar efeitos devastadores de controle na dinmica de legitimao da ordem pblica. Em verdade a filmagem mostra, alm do brutal e inconcebvel ato contrrio ao nosso regime democrtico de direito, um excesso desnecessrio dos Delegados e seus comandados correcionais. Comprovaram que todos so despreparados e atrabilirios. No restaram equilbrio e razoabilidade na presente ao policial. Afinal a Escriv s no queria ar pelo constrangimento de ficar nua na frente de homens, um justo direito. Tudo poderia ser resolvido sem maiores prejuzos com a chamada ao feito de uma Delegada e suas agentes policiais para fazer a revista designada e necessria ali mesmo naquela delegacia, ou ento conduzirem a Escriv suspeita at a Corregedoria de Polcia para as medidas legais e pertinentes, o que em absoluto em nada prejudicaria o flagrante. Medidas devem ser adotadas, istrativamente e judicialmente para que a ordem seja resgatada na Policia civil de So Paulo, sob pena de serem abertos precedentes idnticos nas demais Corregedorias de Policia do Brasil. (*Delegado de Polcia. Ps-Graduado em Gesto Estratgica de Segurana Pblica pela UFS. Exerceu o cargo de Corregedor-Geral de Polcia civil de Sergipe em duas ocasies) [email protected]
Referncias bibliografias: FEITOSA, Denilson. Direito Processual Penal. Teoria, Crtica e Prxis. Niteri: RJ, 2008. BAYLEY, David. Padres de Policiamento. So Paulo: Edusp 2001. TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. So Paulo: Malheiros editores, 2000. COMPARATO, Fabio. A afirmao histrica dos Direitos Humanos. So Paulo: Saraiva, 2007. HOLLANDA, Cristina Buarque de. O problema do controle da polcia em contextos de violncia extrema: Os casos do Brasil, frica do Sul e Irlanda do Norte. Rio de Janeiro: SESC, 2007
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