Brasil : Mais da metade dos municpios da Amaznia ou 2024 inteiro em seca
Enviado por alexandre em 11/02/2025 00:51:41


Mais da metade dos municpios da Amaznia Legal esteve sob seca durante todo o ano de 2024. Uma anlise exclusiva da InfoAmazonia, baseada nos dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), sendo responsvel por emitir os alertas de desastres naturais para todo o pas, revela que, dos 772 municpios da regio, 459 (59,5%) sofreram com o problema climtico de 1 de janeiro a 31 de dezembro no ano ado.

Em setembro, auge do vero na Amaznia, quase todas cidades estavam em algum grau de seca: 759 (98,3%). Na poca, a reportagem navegou o rio Solimes entre os municpios de Tef e Uarini, no Amazonas, e acompanhou Ernan Pereira, piloto que apoia organizao cientfica Instituto de Desenvolvimento Sustentvel Mamirau, e levou os pesquisadores at as comunidades ribeirinhas impactadas pela falta d’gua.

“A gente vive uma realidade [mais surpreendente] a cada ano que se a, principalmente para quem navega e para as populaes ribeirinhas que vivem nessas comunidades, que sofrem bastante com essa estiagem e no esto preparadas”, disse Pereira.

Grandes bancos de areia ocuparam o lugar onde deveria estar o rio, um dos sinais evidentes da falta de chuva. Em menor ou maior intensidade, isso se repetiu em 2024 por toda a regio. O Cemaden utiliza uma classificao de acordo com a gravidade da seca (veja os detalhes da metodologia abaixo). Os piores ndices so “severa”, “extrema” ou “excepcional”, sendo a ltima a mais grave de todas. As verses mais “leves” da seca so a “fraca” e a “moderada”.

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Um nico municpio da Amaznia chegou ao nvel de seca excepcional: Tarauac, no noroeste do Acre. Segundo os dados do Cemaden, a regio estava com limites de precipitao, de gua disponvel no solo e de sade da vegetao em seus piores nveis.

“ muito raro ver uma seca excepcional, porque a gente faz uma mdia dos valores dos ndices e, no final, essa mdia suaviza. A gente pega a chuva, pega o solo, calcula os desvios da normalidade e verifica as classes. Em janeiro [de 2025], a previso que a precipitao seja dentro do normal, mas, nessa regio de Tarauac, as chuvas ainda podem ser abaixo do esperado”, explica Ana Paula Cunha, pesquisadora do Cemaden que responsvel por fazer o monitoramento da seca.

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Tarauac est entre os municpios da Amaznia que aram o ano todo em seca, com variaes entre os nveis, mas sem interrupo. Em janeiro, j estava em seca moderada. A partir de junho, severa; em julho, foi para extrema; em agosto, chegou ao nvel excepcional. Depois, voltou para o nvel extremo at outubro. Em novembro, recuou para seca severa. Mas em dezembro voltou para seca extrema. Pelo menos uma vez, as cidades sentiram a seca

Quase todos os municpios amaznicos vivenciaram a verso moderada do problema pelo menos uma vez em 2024: 747 (96,7%). J a seca severa foi sentida por 486 municpios (63%) e, a extrema, por 74 (9,5%). Em Feij, no Acre, onde vivem 35 mil pessoas, a populao enfrentou, por dez meses, variaes de seca entre moderada, severa e extrema.

Cunha afirma que 2024 foi o pior ano para o Brasil em termos de seca: “A vegetao seca, com um solo seco, temperatura alta, baixa umidade. Essas reas esto mais suscetveis ao fogo, a propagao dele mais rpida, a mobilidade tambm muito impactada e o abastecimento dos rios leva muito tempo”, explica.
Adolescente deitado na rede s margens de praia que se formou aps a seca do rio Solimes. Foto: Jullie Pereira/InfoAmazonia

Em 2024, o dficit de chuvas foi to grande que os principais rios da bacia do Amazonas tiveram o menor nvel da histria. A temperatura mdia da Terra ultraou, pela primeira vez, 1,5C em relao poca pr-industrial, um marco histrico que os cientistas alertam ser fundamental evitar desde o Acordo de Paris, assinado em 2015.

Segundo Cunha, o pas no dispe de um sistema de gesto de risco especfico para a Amaznia, o que compromete a eficcia e a rapidez das respostas. A InfoAmazonia buscou analisar qual deve ser o posicionamento dos novos prefeitos eleitos nas cidades que enfrentaram a seca de 2024, a fim de compreender se h perspectivas de uma gesto mais gil nos prximos anos.

Assim, o levantamento trouxe os dados do ndice de Convergncia Ambiental total (ICAt) do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), que avalia o comprometimento de parlamentares em relao ao meio ambiente, com uma posio favorvel ou no s pautas sobre o tema. Das cidades que enfrentam seca severa, extrema ou excepcional, 117 (89%) elegeram prefeitos com ndice pssimo, ou seja, pessoas contra a causa ambiental. Os resultados tambm mostraram que os prefeitos pr-meio ambiente reeleitos aram por secas mais fracas.
Jacar morto fica preso em galhos de rvore no rio Solimes seco, em setembro de 2024. Foto: Jullie Pereira/InfoAmazonia

O cientista poltico Marcos Woortmann, diretor adjunto do IDS, explica que h uma falta de gestores pblicos capacitados para debater, planejar e executar ideias que criem aes a curto prazo contra a seca. Nos ltimos dois anos, a populao amaznica ficou merc de propostas como distribuio de alimentos, envio de brigadistas e drenagem dos rios, sem projetos que realmente reduzissem definitivamente os impactos dos eventos extremos.

Woortmann afirma, ainda, que necessrio um plano de adaptao em nvel municipal para cada um deles. “A Constituio, no seu artigo 170, traz o direito ao meio ambiente saudvel como um direito previsto naquela Carta Magna. Essas pessoas esto ali fazendo precisamente o contrrio, atuando contra a melhor cincia e contra tambm os saberes tradicionais, porque populaes indgenas, populaes ribeirinhas, tambm tm as suas leituras do meio ambiente”, diz.
E 2025

O climatologista Jos Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden, disse que em 2025 h a previso de a regio sentir os efeitos do La Nia, fenmeno que resfria as guas do oceano Pacfico, mas que ainda no possvel afirmar como ele ir se comportar. “Quando se tem a La Nia, existe uma tendncia de seca no Sul e chuvas na Amaznia, mas temos o oceano Atlntico muito quente, que no est favorecendo as chuvas”, diz. O especialista explica que, por isso, a tendncia do aumento da temperatura na Amaznia vai continuar.
Urubus invadem praia onde antes havia o rio Solimes, em busca de peixes mortos Foto: Jullie Pereira/ InfoAmazonia

At julho do ano ado, um outro fenmeno influenciou o clima na regio: o El Nio, fenmeno que gera o aquecimento das guas do oceano Pacfico. No entanto, Marengo explica que a seca que ocorreu na Amaznia no consequncia de um nico evento isolado.

“A estao seca est ficando mais quente. Durante o El Nio fica pior, mas no o El Nio a causa. Isso est sendo comprovado por diferentes pesquisas. Algumas das causas so, por exemplo, a variabilidade interdecadal do Pacfico e as oscilaes multidecadal do Atlntico. Mas o pano de fundo o aquecimento global”, diz.

Esta reportagem foi produzida pela Unidade de Geojornalismo InfoAmazonia, com o apoio do Instituto Serrapilheira.

*O contedo foi originalmente publicado pela InfoAmazonia, escrito por Jullie Pereira
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